quarta-feira, 26 de setembro de 2018

A mania de dar opinião na vida dos outros

Esses dias estava conversando com uma amiga sobre essa necessidade que as pessoas tem de dar opinião na vida dos outros. O problema não é nem ter a tal opinião, mas sim expressar ela, sem a pessoa que inevitavelmente vai receber a opinião – sobre sua própria vida - ter solicitado. Isso acontece muito com mulheres grávidas, por exemplo. É considerado normal as pessoas se sentirem no direito de dizer “não come tal coisa, faz mal para o bebê” ou “você ainda dirige no oitavo mês? Pois devia parar já!”. Só que essas mesmas pessoas, com opiniões tão certeiras, não oferecem soluções. Não é como se os “opineiros” de plantão tivessem a intenção de ajudar, eles querem apenas “causar” na vida alheia! Eu me pergunto o porquê, será que Freud explica?

Tem um ótimo vídeo já meio antigo da HellMother que ironiza essa situação:


Uma coisa que pessoalmente me incomoda – e muito – é alguém me oferecer uma dieta, sem eu ter solicitado. Vejam bem, quem sabe da minha alimentação sou eu, quem sabe da minha saúde também sou eu, quem paga médico, adivinha só, sou eu. Mas sempre alguém quer oferecer a Dieta-do-Insira-Um-Nome-Bizarro-Aqui que viu na Revista Para Panacas e que fez a atriz Xys Ypsolon emagrecer 40 kg é verdade esse bilhete. GENTE, APENAS NÃO! Se você não vai preparar a sopa do momento pra mim (e depois lavar minha louça, claro) e caso der ruim para minha saúde pagar médico e exames, então, com todo o respeito possível, enfia sua indicação de dieta no meio do olho do seu belo arco que fica entre suas duas nádegas! Se meu corpo te incomoda o problema é total e completamente seu, não venha me pedir pra resolver isso pra você. Meu corpo não ME incomoda e está saudável, isso que importa.

Recentemente lá nas gringas tivemos o caso da modelo Tess Holiday, que foi capa da revista Cosmopolitan do Reino Unido. Acontece que as postagens da foto (linda, diga-se de passagem) causaram alvoroço nas pessoas e elas não puderam se conter. Não, elas não conseguem ficar sem digitar. Deve ser alguma nova doença, algo pra ser estudado: pessoas que simplesmente não sabem guardar suas opiniões. Muitos disseram que a revista estava fazendo apologia à obesidade. Que beleza, né? A gente anda pelas ruas e vê todo mundo magrinho, né? Todo mundo bem Bruna Marquezine aí quando vê uma gorda numa capa de revista vira um auê. Gordura por si só não é doença. Nem todo gordo é doente, nem todo magro é saudável. Pessoas gordas existem aos montes, pesquisa do Ministério da Saúde indica que mais de 50% da população brasileira, por exemplo, está acima do peso. No Reino Unido, onde a capa em questão aconteceu, mais de um quarto da população é obesa de acordo com dados da CIA. Por que cargas d’água então tem gente que se irrita com gordo em capa de revista?

E por ter falando em Bruna Marquezine, ela também fez stories esses tempos atrás contando como sofre pressão estética. Sim, o problema da opinião alheia que machuca não chega apenas para alguns poucos infelizes, ele atinge muita gente, inclusive uma das pessoas mais famosas, talentosas e lindas do Brasil. Alguns comentários em uma de suas fotos no instagram diziam que Bruna estava com “pernas finas que nem um macarrão” e outros a mandavam “engordar”. Não era sugestão apenas, usei a palavra mandar, pois acredito que ela é a palavra certa mesmo. As pessoas que não sabem se controlar chegam ao ponto de se achar no direito de mandar na vida de alguém que nem conhecem pessoalmente. 
capa da revista Cosmopolitn com a modelo Tess Holliday
A tal capa da revista Cosmopolitn com a modelo Tess Holliday
Embora eu tenha reclamado das dietas não solicitadas, para mim o problema maior ainda é sobre saúde mental. Canso de ouvir pessoas opinando sobre minha depressão. “Você está triste? Vai dar uma caminhada, sai de casa um pouco”. Queridos, quando tenho crises de depressão, a última coisa no mundo que quero é sair de casa. Não só não quero, como não consigo. Levantar da cama custa MUITA energia. As vezes, tomar banho é impossível. Só quero dormir o dia inteiro, chorar e ouvir música triste. Quando levanto do colchão, parece que colocaram um peso de 200 kgs nas minhas costas. Faço o mínimo esforço e já me sinto cansada, como se tivesse batido pernas o dia inteiro no Brás / 25 de Março. “Ah, mas pense, tem gente que sofre mais que você, olha as crianças na África e blablabla...”. Primeiro: a pessoa nem conhece a história da África, mas ela quer usar o que aprendeu em algum comercial de TV pra me fazer sentir melhor. Adivinha só? Não ajuda. E olha que ouço muito isso das crianças na Africa passando fome como se fosse um bom argumento para combater minha depressão. Sério. Segundo: não estou e nunca estarei concordando em fazer uma COMPETIÇÃO DE DOR. E terceiro: São dois tipos diferentes de dores, gente. Não tem como comparar. A minha é uma doença, é depressão, tem que ser tratada com terapia, remédios, entre outros. A das crianças é FOME, envolve muitos outros fatores, como política, nível social, etc. Vamos parar de comparar tudo errado além de dar opinião a torto e a direito na vida dos coleguinhas, por favor?

 Imagem retirada daqui.

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Por que somos tão inseguros?

por que somos inseguros?

Passeando pelas timelines das redes sociais volta e meia me deparo com análises ou piadas sobre a questão “Capitu traiu Bentinho?”. É curioso pensar que um livro publicado em 1989 ainda tem o poder de causar rebuliço nos dias de hoje, tamanha é sua fama. Mas não, eu não estou aqui pra falar sobre a questão Capitu. Quero falar sobre o problema em ter vergonha de se expor. Pensa comigo, com certeza Machado de Assis teve episódios de ansiedade, insegurança e medo, afinal, todo ser humano tem essas coisas. E se num desses momentos, Machado sentisse medo de não ser lido ou receio de seu texto não estar bom o suficiente? Se esses sentimentos o tivessem paralisado e o impedissem de entregar a primeira versão de Dom Casmurro, nós não conheceríamos Capitu e Bentinho hoje. Se Machado fosse inseguro ao extremo (e talvez ele fosse, mas dava algum jeito de vencer isso), jamais teríamos outros tantos livros incríveis como Memórias Póstumas de Brás Cubas ou Quincas Borbas.

Mas Machado foi meu primeiro exemplo. Assim como Dom Casmurro, que é leitura obrigatória para vestibulandos, também estão livros como O Guarani, de José de Alencar. E o José, será que teve uma vida linda, sem medos, totalmente seguro de si, de seu trabalho, de sua escrita?

Vamos chegar no nosso tempo, só para dar um exemplo atual de uma pessoa que causa tanto tumulto na internet quanto Capitu: Elena Ferrante com sua tetralogia napolitana. Será que Ferrante tem insegurança ao escrever? Será que, como eu quando escrevo, Elena acha tudo lindo e fantástico e dois meses depois relê e acha tudo uma grande matéria fecal? Ou será que esses autores citados são alienígenas e nunca tiveram medo de entregar seus textos, pois estavam plenamente conscientes da sua genialidade?

Colagem por Graziele Lima para o blog Eu e Minha Estupidez

O ponto onde quero chegar é, tomando como certo que nenhum deles é um alienígena, se essas pessoas não tivessem vencido suas inseguranças quando elas surgiram, não teríamos hoje essas obras e nem estaríamos 100 anos depois discutindo uma possível traição ou postando fotos de trechos de conversas entre Lila e Lenu no Instagram. E a gente, que escreve mas não tem essa fama toda, será que não está se sabotado demais com relação aos nossos textos? Será que não estamos deixando nossa insegurança vencer, em vez de mostrar ao mundo nossa cria?

Eu sei que não sou a única que escreve e não publica por medo, insegurança, vergonha. Conversei com uma amiga que é poeta e escritora e vi que a insegurança em mostrar o que escrevemos não é só minha, é de todo mundo nesse ramo. Ela, por exemplo, escreve coisas lindas e inspiradoras. Mas é muito fácil pra mim, que estou lendo e sendo impactada com o trabalho dela falar isso. Ela perceber o quanto uma vida pode ser tocada se entregar o texto para a internet ou qualquer outro meio, são outros 500, percebem?

Nós deixamos nossa insegurança nos dominar. Por que não paramos e pensamos, como citado nesse texto, que nossas ideias podem parecer óbvias pra gente, mas são incríveis para os outros? Um dia vamos reler aquele texto publicado e encontrar erros, certamente, mas tudo bem, isso só mostra que evoluímos enquanto escritores e não que aquela obra não valeu para alguém.

Colagem por Graziele Lima para o blog Eu e Minha Estupidez

A gente tem medo de arriscar. E eu sei que é difícil, porque enquanto escrevo isso, tenho três livros escritos e guardados só pra mim. Mas me assusta pensar em quantos novos Machados de Assises estamos perdendo. Não precisa nem ser tão genial quanto o Machado, mas poderia ter uma obra impactante, que marcaria os próximos séculos. Quantas Elenas Ferrantes se escondem em pessoas que simplesmente tem medo de mostrar suas escritas as vezes até para um amigo próximo? A gente precisa parar. Só que... eu não sei como. Eu realmente não sei.

Esse texto termina assim, sem solução nenhuma. Se você tiver uma, por favor, ajude essa galera que escreve e que precisa. Salve os Machados, os Josés e as Elenas, por favor. E salve a mim, que preciso aprender a não me sabotar mais.


*PS.: usei colagens feitas por mim, representando momentos de insegurança, para ilustrar esse texto, achei uma maneira não convencional de ilustrar a postagem, ao mesmo tempo em que eu tenho esse momento de vulnerabilidade por postar arte minha aqui, além dos textos.*

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Resenha: Märchenmond - Os Filhos das Terras Sombrias, de Wolfgang e Heike Hohlbein

resenha Märchenmond

Eu comprei esse livro há muitos anos, numa promoção do Carrefour entre os produtos em oferta. A resenha da contracapa chamou a atenção da minha mãe, que sabe do meu gosto por fantasias e logo me mostrou o livro. Olhei, gostei e comprei, mas a primeira tentativa de ler não me prendeu a atenção o suficiente e abandonei o livro. Só retomei num dia do ano passado em que eu estava precisando de uma historia fantasiosa e diferente e logo lembrei de Märchenmond: Em busca das Terras Sombrias. Märchenmond é uma trilogia alemã composta pelos livros A Terra das Florestas Sombrias, Os Filhos das Terras Sombrias e Os Herdeiros da Floresta, escrita por Wolfgang e Heike Hohlbein no início dos anos 80. Devo dizer que comecei a ler errado, direto no segundo volume da série (Os Filhos das Terras Sombrias), mas isso não afetou meu entendimento da história, o único problema foi não conhecer os personagens que iam reaparecendo no segundo livro e já eram velhos conhecidos dos protagonistas. Mas conforme vamos lendo, vamos também entendendo sobre quem são, suas características e personalidade. Mas vamos ao mais importante: o que achei do livro ao terminar a leitura? Separei em dois tópicos importantes antes de dizer se recomendo ou não:

 

O enredo

A história não me prendeu no começo, mas de cara já descobrimos que Märchenmond é tipo uma Nárnia: um mundo paralelo, com tempo e personagens diferentes. Esse foi um dos pontos que me atraíram para a leitura, pois: apaixonada pelas Crônicas de Nárnia. E acontece isso mesmo: o personagem principal, Kim, de repente consegue entrar nesse mundo paralelo, chamado Märchenmond, onde existem reis, príncipes, anões, dragões e outras criaturas fantásticas.

Uma coisa que me surpreendeu foi o final. O livro consegue manter o mistério principal sem solução até suas últimas páginas. E eu juro que imaginei mil e um motivos para explicar o tal mistério e nenhum chegou perto do que aconteceu.

resenha Märchenmond

 

A escrita

Não sei se foi problema de tradução, mas eu me senti desconfortável com a construção de algumas frases, que não fizeram muito sentido, sabe? Mas como disse Stephen King em seu livro Sobre a Escrita, a gente tem que ler de tudo, seja bom ou ruim. E Märchenmond não chega a ser ruim, tem uma história boa, só achei mal escrito (ou, volto a repetir, mal traduzido. Não entendo nada de alemão para saber).

Não espere diálogos impactantes e revolucionários. Todas as falas são muito simples.

Uma coisa que me incomodou muito foram os momentos de virada da história. Sabe quando o personagem fica entre a vida e a morte e então alguma coisa muita louca acontece para salvá-lo? Então, Märchenmond peca demais nesses momentos. Antes do grande acontecimento SEMPRE tem frases como “e então, o milagre aconteceu” ou “o inesperado aconteceu”.

Para quem estuda escrita criativa, que nem eu, o livro traz muitos ensinamentos, principalmente sobre descrições. Você consegue imaginar a cena, as cores, sentir o cheiro e a textura somente lendo. Não tem descrição demais, a criação dos personagens fica por conta da imaginação do leitor, com um pequeno empurrão dos autores, tudo no ponto certo.


Resumão: Märchenmond tem uma história muito boa, um final que surpreende, com muitos bons exemplos de escrita criativa, porém com diálogos fracos e muitas frases mal escritas. Não é um livro que eu saio recomendando por ai, mas também não é um livro que eu falo logo “fuja, não leia isso não!”. Fiquei bem em cima do muro com ele.